quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Outra Questão de Estética

"September", Gerhard Richter, 2005, óleo s/ tela, 52 cm x 72 cm


A questão da estética pode ser abordada sob o que se poderia chamar uma perspetiva ambiental e que pode ser entendida como o constatar de que em diversas ocasiões ocorre uma subcorrente estética – no sentido de aesthesis (ver "Uma Questão de Estética") - mesmo que esta não seja predominante[1]. Uma obra de arte, e em particular uma boa obra de arte, pode ser identificada e compreendida numa dessas ocasiões quando se reconhece a obra dentro de três critérios: proporção, equilíbrio e complexidade da ocorrência da corrente estética[1]. Um exemplo para ilsustrar este raciocínio poderá ser a obra “September” de Gerhard Richter. Aquando do atentado de 9/11 às torres gémeas em Nova York, Gerhard Richter terá observado, por exemplo, a beleza das cores das chamas aquando do embate de um dos aviões. Obviamente declarar tal coisa poderá ser encarada como algo horrendo. Mas estamos na presença de uma daquelas situações em que ocorre indubitavelmente uma subcorrente estética. Ao pintar o quadro “September” Gerhard Richter tomou para a obra aqueles três critérios estéticos– proporção, equilíbrio e complexidade – transpondo uma ocasião terrível para uma obra de arte.
Por oposição ao quadro de Richter temos as imagens que nos bombardearam a mente de forma constante - e que são hoje um ícon, aliás – pelos mass media onde todas as características da formalização de uma obra de arte poderiam estar presentes não fossem aqueles três critérios ditarem outra coisa: pelo menos, no que toca aos critérios de proporção e equilíbrio da corrente estética daquela ocasião (ou acontecimento) faz-nos constatar que não estamos perante uma obra de arte nem de imagens de uma obra de arte mas apenas que estamos a ser informados. O “bombardeamento imagético” dos mass media com aquelas imagens leva-nos ainda a outro conceito-base da experiência estética: o conceito de perceptual commons (em português: perceptivos comuns)[1]. O perceptual common é, digamos, um direito que não pode ser reclamado juridicamente, de acesso direto, e qualquer restrição a esse acesso é considerado um desvio dessa condição. Para ilustrar: tenho o direito de, ainda que não o possa reclamar juridicamente, de caminhar na rua sem ser incomodado pelo mau cheiro que o vento traz a partir de um esgoto afastado. Outro exemplo: tenho o direito de estar num café e não ser bombardeado com imagens horríveis de uma catástrofe a todo o momento pelos noticiários da TV. O conceito de perceptual commons leva-nos para outro campo da experiência estética, o campo que não se prende meramente com a crítica e análise da arte mas afasta-nos daí em direcção a um sentido mais abrangente da experiência estética (sempre enquanto aesthesis): a da forma de estar no mundo do homem e da sua condição humana[1]. A arte "apenas" poderá ser uma das formas de estar do homem e uma das formas que a condição humana assume. 

[1]Arnold Berleant, "Sensibility and Sense",2010 
Para saber mais:
Arnold Berleant, "The Aesthetic Field", 1971
Arnold Berleant, "The Aesthetics of the Environment", 1992
Arnold Berleant, "Sensibility and Sense",2010

"Gerhard Richter in the Studio", uma entrevista com G. Richter no Youtube (clique aqui)

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